quinta-feira, 28 de agosto de 2008

À memória de uma parte de mim

Nasceu em 1920 , casou-se em 1933. Cinco filhos , mais um na barriga e o aviso do falecimento do seu marido. Semelhante à mãe, ela era filha única. Naquele momento, 1946, eram os filhos, a mãe e seu coração que, ainda, não consentia aquela morte. A cabeça, os troncos e os membros poderiam desnortear-se em milímetros de segundos, mas assim como sua mãe, os pés de vó Mariêta eram do norte. Verdejou o pranto, amansou tempestuosos desencontros e, em 1961, descobriu o cerrado, um alumiado recanto. Conheceu um outro homem, talvez, tão especial como o primeiro. Pedida em casamento, disse não. O menor receio de que um homem não agasalhasse seus filhos, passava longe de seu extenso manto. Sorriu muito durante a vida, festejou a família e os amigos. Em 1995, uma parte de mim elevou-se e seguiu...

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Domingo, 24 de agosto, às 4 horas da tarde, a brincadeira era pique-pega. Três meninos, três meninas e as idades variavam entre quatro e onze anos de idade. Enquanto um contava até vinte, os outros cinco corriam. Débora, de 4 anos, é irmã gêmea do Davi. Os dois são irmãos da Beatriz, de 9 anos, a primogênita. Gabriel, de 11 anos, desde o início do pique-pega, anunciou em voz alta, principalmente para o João, de 10 anos, que é bem afoito: "os menores são café com leite". Quando Davi caía, algumas vezes durante a corrida, minha alegria, Letícia, de 8 anos, pegava-o no colo e cantava: "pirei na batatinha". Depois, Davi voltava a correr feliz da vida. Débora não caiu nenhuma vez. Quase uma hora depois, durante o pique-pega, a caçulinha da turma falou: "me espela pessoal", já que daquela vez ela começou a correr, enquanto quem estava no pique já quase chegara ao vinte. Quando Débora ouviu Gabriel falar em café com leite, deve ter pensado no pai que adora café e na mãe que só toma café com leite ou pensou outra coisa qualquer. Mas que sua carinha estava sapeca, estava.

domingo, 24 de agosto de 2008

Pode ser um quarto de um tempo de um dia, ou dois quartos de dois tempos de um mês, ou ... Nenhum ruído traz um novo ânimo, nada. O silêncio que, antes, gritava tudo, agora nem esconde nada. Quando foi a última vez que usei um relógio em meu pulso? Talvez na adolescência. Há mais de vinte anos, talvez. Desconfio de pessoas didáticas. O engraçado é que minha experiência com os didáticos não foram e nem são tão ruins assim. Merecem meu respeito. O que, ainda, me faz acreditar é que ele não é nada didático.

sábado, 23 de agosto de 2008

Como é triste ver a pessoa amada escolher o nada,
quando poderia ser tudo.
Já não mais tento e lamento.
Quando o que há no nada é apatia, o tudo seria, talvez, apenas uma leve calmaria.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

RUMO AOS 82


Brasília, 09 de fevereiro de 2007.

PAPAI,

Hoje, Deus te presenteou logo cedo ao mostrar-te o céu de um azul tão claro e recheado por nuvens que mais pareciam pedaços gigantes de algodão doce. O sol acompanhou o dia e, como as chuvas vêm nos refrescando nas últimas semanas, imagino que o verde das árvores próximas à janela do seu quarto sorriram por mais uma dia estarem perto de ti.
A minha intenção hoje é falar espontaneamente da minha admiração pelo ser humano, filho, pai e avô que o senhor é. Porém, escolhi escrever algumas linhas para não esquecer e, assim, é uma forma do senhor guardar essas singelas palavras que, muitas vezes, ao invés de dizermos, deixamos conosco em nossas mentes.
ANÍSIO vem do grego e o significado é sugestivo: "completo, perfeito". Essa idéia de perfeição para os habitantes desse planeta Terra não existe, mas posso afirmar que o senhor é um homem que tem inúmeras aptidões. Aliás, sempre falo que o senhor deveria ministrar um curso que ensinasse aos homens das outras gerações como desenvolver tarefas que os homens da sua época faziam. Claro que os tempos são outros. Há o avanço tecnológico e os homens desses novos tempos têm outros recursos que o senhor não tem. Mas, se somados os seus conhecimentos com os de agora, talvez a QUASE PERFEIÇÃO!
Anísio Geraldo Ramos quase completo. Um filho que soube honrar os pais, um homem íntegro, um esposo presente, um pai que harmoniza o dia-a-dia da vida familiar e, se não bastasse, um avô que nos ajuda a agasalhar a nossa linda Letícia. Por tantos detalhes tão especiais, muitas vezes não revelados, não pronunciados tanto pelo senhor como por nós: eu - Sheyla-, sua esposa Maria do Carmo, sua filha Alessandra e sua neta Letícia, nesse momento dizemos que AMAMOS você e agradecemos muito a Deus por termos a sua SERENIDADE nos momentos difíceis, os seus SORRISOS nas conversas em família e, até a sua braveza, nos tempos necessários.
Lembro-me de que há uns dez anos nossa relação não era afetuosa como é atualmente, pois amar exige conhecimento, respeito, admiração e, para tudo isso, leva-se tempo. É engraçado como as pessoas dizem eu te amo na maior facilidade. Demorei muito para dizer eu te amo para o senhor. A primeira vez foi naquele aniversário que fizemos para comemorar o seu dia na casa da Sandra, lembra? Pois é, muitos anos passaram. Para o senhor, então, heim?
OITENTA ANOS vividos no maior pique, em plena atividade. Acorda cedo, faz café da manhã, compra pão na padaria, leva e busca a Letícia no colégio, verifica como o prédio está, passa instruções ao porteiro, vai ao banco, toma o seu cálice "sagrado" de vinho, assiste aos telejornais, escuta a CBN, delicia-se com suas músicas favoritas, arranha no computador, cuida do “carrinho”, é assíduo aos encontros filosóficos, redige tudo referente ao condomínio, escreve parágrafos e parágrafos a respeito dos assuntos filosóficos, e não pára por aí. Faz caminhadas aos domingos no parque Olhos d'água, é atento a política do país, tudo isso, sem falar nos três andares que separam o térreo do bloco ao seu “lar doce lar”. Haja fôlego...
Se a maioria da população mundial tivesse a metade da sua VITALIDADE, o mundo, com certeza, seria quase perfeito. Hum, de novo a história da perfeição que é um dos significados do seu nome.
Além de agradecermos a Deus a FELICIDADE de estarmos ao seu lado, rogamos que muitos e muitos anos possamos continuar a desfrutar da sua companhia que tanto nos fortalece e enche de alegria. Nós amamos você do seu jeitinho: qualidades, defeitos, diferenças. Como diriam os sábios, só se conhece alguém quando comemos um saco de sal com essa pessoa, então acrescento que é mais seguro dizer que amamos alguém quando compartilhamos desse sal.
No Salmo 90, versículo 10 lê-se: “Os dias da nossa vida chegam a setenta anos, e se alguns, pela robustez, chegam a oitenta anos, o orgulho deles é canseira e enfado, pois cedo se corta e vamos voando.” No entanto, no Salmo 92, versículos 12-15 lê-se: Os que estão plantados na casa do Senhor florescerão nos átrios do nosso Deus. Na velhice ainda darão frutos; serão viçosos e vigorosos. Para anunciar que o Senhor é reto. Ele é minha rocha e nele não há injustiça.”
Então, super ANÍSIO que o SENHOR JESUS continue a trazer o perfume do AMOR para a essência do seu ser, este humano que a sua família conhece, admira e tem orgulho de ter.

Com carinho,
A sua família.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Toda vez que preciso juntar os cacos de minh'alma, vejo-me criança e peço para ser essa a última vez. Com o passar do tempo, sinto o perfume do alívio, esqueço e sigo. Com o passar de mais um tempo, o enjôo do amargo ressurge. Emendados dois dias e duas noites, não resta mais que um corpo fadigado e uma mente em frangalhos. Não me surpreendo com a existência de qualquer outro sopro próximo a mim. Nada mais a fazer do que recolher os recados e repassar aos interessados. Diagnósticos confirmados, receituários aplicados. Meu Deus, já não pergunto mais porque eu.

sábado, 16 de agosto de 2008

Música do blog

Vou tentar colocar, mas o problema é entre a cadeira e o micro, rs...

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Para Karen e Valentina

Quando tudo encurtou-se,
Nada mais abrasou-se.
Os sinos aquietaram-se,
E as flores ilharam-se.
...
O sorriso pelo apego
Era esperança por um aconchego.
Mas havia uma enxurrada de cascalhos
E a vastidão de inúmeros atalhos.
...
Sonhos desmesurados
E delicadamente adocicados.
Amor sobre-humano,
Até breve, meu encanto!
O primeiro alvor da manhã mostrava a limpidez que estampava minha janela. Avistei na imensidão daquele céu uma nuvem pequena, única. Ora aparecia, ora escondia-se. Sentia meus olhos hipnotizados à espera daquele desejo inexplicável em poder alcançá-la. Parecia uma criança faiscante por um algodão doce num dia de passeio ao parque. Percebi que aquele segredo não era algo inatingível. Meu Deus, por que surge em mim uma fome diferente a cada dia?

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Hoje, ela pegou o caderninho que estava bem escondido e, depois de lidas algumas folhas, resolveu guardá-lo novamente. Exatamente 25 dias haviam se passado sem nenhuma grande manifestação. Aquela a quem desconfiava surgia nas horas mais impróprias. Incoveniente, astuta e com uma perversidade não impressa em palavras.

Hoje, ela teve medo. O primeiro encontro foi há nove anos, onze meses e muitos dias. Isso significava que nas próximas horas, aquela outra poderia aparecer com alguma má intenção, só para marcar os dez anos.

Hoje, ela ficou em dúvida se havia escolhido o companheiro certo para cuidar de sua filhinha. Seus pais em idade avançada e ninguém mais com quem contar.

Hoje, ela continuava a acreditar que teria mais dez anos ao lado de sua filha.

Hoje, ela também continuava a acreditar que aquela outra a esqueceria de vez.
...
Hoje ainda não havia acabado e de uma certa forma aquela outra sempre mandava um recado: horário dos remédios. Ela os olhava e pensava: pelo menos, eles são coloridos.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

BRAVO!

Moravam na mesma cidade e já haviam sentido aquele friozinho na barriga de quem espera por um telefonema no fim da tarde de uma sexta-feira. Naquele ano, ainda não existia celular, bina, nada que identificasse quem fizesse uma ligação. Quando o telefone tocava na casa, ela corria pra atender. Do outro lado, sempre era a mãe ou alguma amiga querendo um bate-papo. Outras vezes era engano. Outras vezes quando ela pegava o telefone a ligação já havia parado. Ela começou a sentir-se ridícula pela corrida ao telefone. Iniciou, assim, uma série de questionamentos. Como uma balzaquiana, independente, responsável e inteligente, corria à espera de uma ligação?

Ele era um homem meio desligado. Não conseguia guardar o nome das pessoas. Números de telefone, então, nem pensar. Até o da própria casa já havia esquecido uma vez. Porém, também era independente, responsável e inteligente. A angústia causada pela última ligação recebida perdeu-se no tempo. Ele não esperava mais.

Era setembro de uma quinta-feira chuvosa. Cansada, saiu do trabalho sem se importar com o tempo ruim que estava lá fora. A chuva aumentou quando estava próxima ao Teatro Nacional e resolveu parar o carro ali mesmo. Observou que haviam muitos carros estacionados e lembrou-se de que era dia de concerto. Decidiu abrir sua sombrinha e assistir. Seus passos foram corridos, pois percebeu que já iriam impedir a entrada. Meio esbaforida, sentou na primeira cadeira vazia que conseguiu avistar.

Após algumas peças executadas, eis que surge o concerto para piano nr 15 em B maior KV. 450. de Mozart. Ela fechou os olhos e deixou-se absorver pelo colorido esfuziante que aquele instante permitia. Fim de concerto, muitos bravos, e ela foi a última a sair do Teatro. Parecia não querer sair dali.

Surpreendeu-se quando encontrou uma amiga do trabalho que tinha aversão à música clássica. Após alguns minutos, um dos músicos da orquestra aproximou-se e abraçou sua amiga. Ela sabia que sua amiga era separada, então concluiu em poucos segundos que os dois poderiam ser namorados. E por poucos segundos, achou que poderia ser até interessante duas pessoas parecerem tão diferentes e estarem juntas. Outros segundos passados, sua amiga apresentou seu irmão e a convidou para acompanhá-los. Extasiada, ela aceitou. Enquanto sua amiga preparava o jantar, eles conversavam. Era tanto assunto que sua amiga acabou dormindo. Trocaram o número do telefone e o dia seguinte era uma sexta-feira.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Aos cinco anos, Maria Cecília ganhou um passarinho de presente de seu pai. De tão emocionada, não parava de olhar e conversar com o bichinho. O pai de Maria Cecília falou para que ela tivesse muito cuidado com a gaiola onde o passarinho estava, pois ele só iria cortar uma das asas do bichinho depois de uns dias. Obediente que era, ela fez exatamente o que seu pai havia pedido. Passados dois dias, o pai de Maria Cecília disse que na quarta-feira seguinte, ele teria tempo suficiente para cortar a asa do passarinho. De repente, Maria Cecília achou tão estranho aquele bichinho dentro da gaiola. De repente, Maria Cecília achou a gaiola uma coisa esquisita, muito esquisita. De repente, seu coração começou a sentir um apertinho e sua cabeça ficou um tanto embaralhadinha. De repente, o apertinho no coração foi embora, o embaralho na cabeça passou, e uma de suas mãozinhas abriu a estreita porta da gaiola, a outra apanhou o bichinho, e depois de dizer algumas palavras bem baixinho para que ninguém a ouvisse, ela abriu suas mãos de menina e sorriu encantada para a vida.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Depois de tantos ares passados, ela conseguiu perceber a indescritível clareza que alguém já havia lhe tentado contar, mas que ela acreditava nunca alcançar. Aquela névoa, que antes confundia suas retinas, definitivamente, havia se dissipado por meio de uma respiração profunda, carregada de mansidão. Relembrou seus tempos de menina, a antiga casa da chácara e retornou, assim, para a clareza por hora descoberta. Envolvida por seus próprios afagos, sentiu-se liberta, regada para um novo recomeço!

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

DONA JOANINHA

Em 1981, aos 10 anos de idade, eu caminhava e corria devagar pelo eixão na altura da 111 Norte, em Brasília. Ao meu lado, estava Dona Joana conhecida carinhosamente como Dona Joaninha. Lembro-me dos sorrisos serenos, iluminados pelos raios daquela manhã ensolarada e refrescante que tínhamos no rosto. Em algum momento daquela caminhada, Dona Joaninha fez um aceno com uma das mãos indicando um tchau ou um até logo. Com aquele aceno, ela mudou de direção. Repeti o mesmo gesto e ela se foi com um sorriso manso que cintilava em seu corpo. Em outro momento, despertei em Juiz de Fora, Minas Gerais. Algumas horas depois, o telefone tocou e, por certos instantes, uma breve ventania percorreu todos os espacinhos mais recônditos do meu ser. Tempos depois, entendi que o privilégio daquela alegre despedida não mais seria esquecida.