segunda-feira, 3 de novembro de 2008

A vida de Estela

Sobre a cama de casal haviam quatro travesseiros. Dois de plumas e penas de ganso e outros dois de um material que ela não recordava. Quando foi puxar um dos travesseiros de plumas e penas de ganso no qual ele apoiava-se, ela percebeu um ruído que sugeria algum tecido rasgando-se. Como estava sonolenta, não quis conferir o que acontecia. Pegou esse travesseiro e o outro também de plumas e penas de ganso e colocou-os em cima de uma cadeira próxima. Assim, os dois poderiam dormir com os travesseiros que mais gostavam. Os outros de plumas e penas de ganso serviam apenas como adorno. Ele dormiu. Ela não. Maria Cecília começou a pensar o que poderia ter provocado a rasgadura no tecido. Sabia que aquele travesseiro não era usado e que só de vez em quando trocava os tecidos que os cobriam. Não lembrava a última troca e pensou que o tecido já poderia estar rasgado quando ela trocou-os. Sorriu. Pensou que já era tarde da noite e ela preocupada com um detalhe desses... Sorriu novamente. Esqueceu-se dos travesseiros e lembrou-se do que acontecera durante aquele dia. Por volta de meio dia e meia, Maria Cecília não encontrou vaga próxima ao restaurante no qual almoçavam três vezes por semana. Depois de duas insistências, ela avistou um carro em outra direção estacionado abaixo de uma grande copa de uma mangueira. Parou por ali. Quando saiu do carro, não foi ao restaurante esperá-lo como de costume. Ligou e disse para que ele estacionasse dentro da quadra, uma vez que uma vaga estava difícil. Depois da ligação, achou melhor caminhar um pouco para que ele pudesse avistá-la assim que chegasse. Começou a escutar um ruído gostoso. Caminhava devagar e à medida que seus pés encontravam as muitas e muitas folhas secas, uma aurora de quietude dava-lhe a mão como companhia. Os pés de Maria Cecília pararam e ela permitiu-se aquele instante. Viu muita vida. Viu uma mulher por volta dos quarenta e uma menina que aparentava dez anos com uma mochila nas costas. As duas estavam de mãos dadas, talvez mãe e filha. Viu três rapazes por volta dos quinze. Falantes, brincalhões... Com a chegada de uma brisa confiante, ela viu que muitas e muitas folhas caíam de uma árvore avivando um movimento diagonal. Ao mesmo tempo, um carro alto, estilo pick up, na cor prata, passava ao seu lado e trazia uma menina por volta dos sete anos. Ela usava óculos de grau e fitou Maria Cecília com uma meiguice no olhar. Também, ao mesmo tempo, a menina com o dedo indicador da mão direita ajustou os óculos, e Maria Cecília, também, com a mão direita retirou os escuros. Paradas, Maria Cecília, abaixo de uma árvore, e a menina, dentro daquele carro em movimento, olharam-se ternamente. Então, o carro se foi. Ele surgiu e Maria Cecília contou sobre a alegre quietude. Mais alguns instantes e, de olhos estrelados, chegaram ao Girassol colorido que aguardava os dois.

7 comentários:

Claudia Pimenta disse...

oi sheyla! bom lhe ver de volta ao universo das palavras...já estava com saudade! bela reflexão... bjs, querida, e boa semana!!!

Bel disse...

Das pequenezas sempre surgem imensidões. Essa é uma das minhas teorias conmfirmadas. São os olhos... adornados pela poesia.
Um beijo,
Bom estar por aqui.
Bel.

Helena Castro disse...

nada como se deixar surpreender! : )

beijos

Karen disse...

aii que delícia te ver assim!!!!!
como em epocas boas, os textos lindos, leves. uma verdadeira poeta que me faz sentir lá, na historia...

estou muito orgulhosa (com toda sua licença)
de ti.
otima semana, querida Sheyla.

bjs

Biana França disse...

Pequenas coisas que se fazem grandes...nosso pequenino olhar que encontra um mundo tão cheio de maravilhas!
Grandes Bjus.

Verson Souto. disse...

Eu viajo nas suas palavras!
Bonitas palavras.


Beijos.

Elga Arantes disse...

Que bom que voltou. Demorou, bem!!
Adoro seus textos suaves, delicados e com uma beleza cotidiana.
Saudades.