terça-feira, 26 de maio de 2009

Para uma amiga

Amiga,
Entendo seus sentimentos porque também sou mãe.
Não biológica, mas mãe.
Não fiquei surpresa, nem tive qualquer outro sentimento quando fiquei grávida, porque, simplesmente, nunca fiquei grávida.
Porque nunca fiquei grávida, não enjoei, nem vomitei, nem senti tonturas, nem tantos outros sintomas.
Mas apesar de nunca ter ficado grávida, já enjoei, já vomitei, já senti tonturas e tantos outros sintomas.
Quando você esteve grávida, aos poucos, descobriu-se  acompanhada.
Por sentir-se acompanhada, você sabia que tinha que ser forte, pois sua companhia, ainda, era indefesa e dependia de você.
Por essa dependência, você foi tomando consciência de que nem tudo é como a gente quer.
Que nem sempre, querer é poder.
Que existe muita coisa escrita que é linda de ser lida, mas que não dá pra chutar o pau da barraca e querer, só porque querer é poder.
Que o querer daquele momento de gravidez era muito mais bonito do que qualquer outro sonho.
Que, talvez, o sonho de antes fosse infinitamente pequeno perto do sonho de carregar um ser dentro de si.
Que outros caminhos precisavam ser enfrentados.
Que muitas curvas e muitas "tesourinhas" aqui de Brasília precisavam ser percorridas com muito, muito cuidado.
Que outros cuidados precisavam ser tomados. 
Que a tomada de consciência de tantas outras descobertas borbulhavam seu fôlego.
Que respirar, às vezes, era muito doído.
Que viver, às vezes, era muito doído.
Que tantas coisas eram doídas que, às vezes, melhor seria sumir.
Mas depois de tantos sentimentos duvidosos, sumir não seria a melhor escolha,
Porque a vida já adiantava outra vida.
Que essa nova vida precisava ser vivida.
E o tempo foi passando.
A moça-menina ia na "marra" se tornando uma mãe-mulher.
Uma mãe-mulher que descobre que o querer e o poder de antes mudam o sentido.
Que esse sentido sublima todos os outros.
Mas que, na verdade, nem tudo é tão poético assim.
Que trocar fralda, amamentar, levar ao médico, é um corre-corre danado.
Que quando estava tudo muito quieto, você verificava a respiração dela, enquanto ela dormia.
Aliviada, sentia-se exagerada.
Descobriu, também, que existia um monte de vacinas e que sua filha, como todas as crianças, precisava ser vacinada.
Descobriu um monte de outras coisas.
Descobriu que cuidar de uma filha parecia uma eterna escalada de novas descobertas.
Descobriu que parecia um sonho ser mãe.
Descobriu que existiam muitas responsabilidades.
Descobriu que responsabilidades combinavam com habilidades.
Descobriu que com muitas habilidades, a vida deveria ser levada.
Descobriu que comida, roupa, médico, escola, etc, tem um preço.
Descobriu que, mesmo separada, conseguiria pagar esse preço.
Descobriu que sorrir é o melhor remédio do mundo e, que graças a Deus, esse remédio não tem preço.
Viu muita gente crescer, morrer, e outras nascerem.
Viu, no meio disso tudo, sua filha crescer.
Viu, que a cada dia ela crescia mais linda.
Sentia alegria, alegria, alegria.
Apesar de ser uma mulher muito falante, radiante...
Escondia seus medos, seus anseios e seguia.
Seguia forte, forte, forte.
Era e ,ainda, és um ser humano, graças a Deus.
Outros tempos passaram, uma nova gravidez.
Outros tempos passaram.
Escondia seus medos, seus anseios e seguia.
Seguia forte, forte, forte.
Ah, mas às vezes explodia, graças a Deus, e seguia e sorria e vivia.
Outros tempos passaram, perdeu a mãe e muitos outros também se foram.
Outros tempos passaram, sua menina cresceu, viajou, e se foi por uns tempos.
Apesar de ser uma mulher muito falante, radiante...
Escondia seus medos, seus anseios e seguia.
Seguia forte, forte, forte.
Chorou, orou, implorou a Deus.
Mas no fundo continuava a esconder seus medos.
Até que agora,
Só pode ser a hora.
De chegar, sentar, conversar,
E, talvez, uma parte daqui, uma parte dali
Cheguem no aí.
Aí tudo pode deixar de ser apenas lido
E passar para o ouvido.
Algumas palavras ternas,
Outras palavras duras,
Mas palavras sinceras,
Que não escondam mais seus medos e seus anseios,
Que saiam do coração e também da razão.
Porque nessa vida a gente precisa de emoção,
E também precisa de chão.
Não é tarefa fácil,
Mas se dividida por 2,
Pode ser tornar menos complicada,
E ser mais sábia,
E ser mais clara!
 

8 comentários:

Luciana Aquino disse...

Sheylinha, tava sumida...
Vc me surpreende a cada dia, linnnnndo o seu texto, adorei.
Bjos dessa sua amiga tbem sumida.

Sheyla disse...

Lu,
Voltei, rs...
O interessante de uma amizade é que não precisamos nos ver ou falar constantemente. O que vale é o sentimento que carregamos em nossos corações.
Saudades sinceras da amiga de sempre.

Elga Arantes disse...

Sheyla, juro, estou sem saber como escrever aqui para que vc entenda o quanto emocionada fiquei com o texto. Até certo ponto, poderia ter sido escrito para mim, e acho que para uma parte grande das mães de todo o mundo. Porque apesar de cada um ser único, a unidade existe e para cada sensação inventamos um nome e cada uma das diferentes pessoas já tiveram sentimentos com nomes iguais, várias vezes. Parece uma psicografia, sei lá. As palavras deslizam no papel e, ao final da obra, pensei: "Já acabou?". Quero postar em meu blog, posso? Com os devidos créditos, claro!

Obrigada por me fazer sentir assim, hoje. Sonhadora, com o piso sempre pregado na sola dos sapatos (para poder tirá-los, de vez em quando); solitariamente acompanhada; invariavelmente feliz (há que se lembrar da diferença entre felicidade e alegria).

E assim seguimos, forte, forte!

Um beijo muito carinhoso.

Sheyla disse...

Elga,
Pode postar no seu blog. Fico honrada.
Bjs repletos de afeto.

sblogonoff café disse...

Oi, moça!
Este é um dos seus textos que mais gostei.
E me faz pensar em minha mãe.
No início, parecia para uma grávida neófita, mas com o desenvolvimento, parece um flash back.
Eu não sei nem um terço do que é ser mãe, mas posso sentir a magnitude dessa função aqui na Terra.
Ver sonhos suplantando outros e ver que a vida por si só muda os sentidos. A gente acaba aprendendo que quem dá sentido e importância a certos desejos e planos são as situações. As situações mudam e os planos acabam mudando também. Não imagino nada que implique em mais reníncias do que a maternidade, por isso acho lindo.
E tem a questão do desapego, que é a renúncia aos próprios anseios em relação aos anseios do filho.
Minha mãe teve 5 filhos e levando em consideração apenas minha escolhas, vi minha mãe como um ser incrível, capaz de me amar acima de tudo. Capaz de me amar acima de todo caminho que percorri, que foi bem diferente daquele que ela traçou.
Foi preciso desapego para não fazer chantagens emocionais, para fazer renúncias para que eu pudesse seguir, mesmo que fosse o caminho torto que escolhi...
(Na verdade, não existe linha reta, né?!Isso é só ilusão!).
Preciso ligar para minha mãe e dizer que a amo!
Muito bonito seu texto!
Um abraço!

Karen disse...

meu deus do céu, que coisa mais linda!
como dizer, o que senti lendo isso?
parece que você estava me dando um recado, sabendo exatamente o que dizia.

obrigada por compartilhar ese texto fabuloso conosco.
saudade.
beijo

Bel disse...

Bonito isso que oferecestes a tua amiga. Um texto forte e preciso. Grande e leve. Doçuras amorosas.
Um beijo, Bel.

Elga Arantes disse...

Oi, flor. Agora que vi que vc autorizou a postagem lá no Prometeu, rsrsrs. Lerda, eu, né?

Vou colocar lá, porque é lindo, mesmo. Vim ler de novo...

Beijos.